No final de Fevereiro não fiz este apanhado poque só tinha lido um álbum ilustrado e achei que, por isso, faria mais sentido juntar as leituras de Fevereiro e Março na mesma publicação.
“Aniversário”, de José Pedro Moreira & Clara João Silva
Um poema ilustrado lindamente. A intensidade das cores e da obscuridade das cenas passa uma mensagem de reforço às palavras.
Podem ler gratuitamente aqui.
“Crónica de uma Morte Anunciada”, de Gabriel García Márquez
Neste pequeno livro, é-nos narrada a história da morte de Santiago Nasar, ou pelo menos é o que parece inicialmente, pois na realidade é uma porta para uma comunidade, para as pessoas que o rodeiam e o que elas fazem, ou não fazem, para impedir o fim de Santiago Nasar.
A narrativa faz-nos saltitar entre diferentes momentos, tanto no presente (do evento) como no passado e até no futuro. Esta escolha poderá parecer confusa, mas a escrita do autor faz com que faça todo o sentido, numa espécie de sequência de pensamento (stream-of-thought) que só é intensificada pelo facto de sabermos o desfecho e, mais ainda, por termos a noção que se trata de uma história verídica.
Há sempre que ter em consideração a época em que esta tragédia ocorre, mas, mais que isso, é através da apresentação de todas as pessoas que vivem na aldeia (e os de fora também), que percebemos como foi possível esta morte ocorrer quando toda a gente sabia e podia ter prevenido o mesmo desfecho. É caso para dizer, se não tivesse acontecido, era fantasioso demais até par ser imaginado.
Aconselho vivamente esta leitura. Foi a primeira vez que li um livro da obra deste autor e fiquei com vontade de ler outros.
Este livro foi leitura para o Clube de Leitura de Braga.
“A Estirpe”, de Guillermo del Toro & Chuck Hogan
Mais um livro lido para o Clube de Leitura de Braga.
Este livro chamou a minha atenção por ser co-escrito pelo Guillerme del Toro, cujo trabalho cinematográfico já sigo há vários anos.E posso dizer que a nível do ambiente que se espera, não desilude.
Este livro, embora sempre com uma narrativa urgente e carregada de suspense, tem uma primeira terça-parte mais de construção do “palco de acção” e das próprias personagens, que está incrivelmente bem conseguida. Vamo-nos aproximando dos protagonistas, dos passageiros e das suas vidas, envolvendo-nos nelas e ficando a conhecer as suas motivações antes mesmo de o impacto total do “vírus” tomar o protagonismo. Isto permite uma ligação intensa com todas as personagens e uma certa aflição por sabermos que o que está para vir é bem pior do que o que já ocorreu antes.
No entanto a partir da última terça-parte a narrativa perdeu alguma força porque estas mesmas personagens pareceram mudar de personalidade e atitudes com demasiada leviandade. Estamos a falar de cientistas que durante toda a sua carreira se dedicaram a salvar vidas. Penso que não seria assim tão fácil conseguir que eles se tornassem caçadores de vampiros, mesmo dadas as circunstâncias.
Tirando esta situação, a ação está muito bem conseguida, a escalada de violência e de tensão também, e ainda ficou muito por desvendar, para os livros seguintes (que fico com vontade de ler).
Aqui temos vampiros que são criaturas sem grande sentimento (um regresso aos primórdis do género), que vivem para se alimentar e que criam o caos por se propagarem com tanta rapidez. Possuidores de uma mentalidade coletiva tipo colmeia, é fascinante perceber como funcionam. No entanto pareceu-me inverosímil que depois de tanta destruição as autoridades ainda não tivessem percebido o que se estava a passar.
“99 Ways to Tell a Story: Exercises in Style”, de Matt Madden
Partindo de uma ideia de preconizada por Raymond Queneau em “Exercises in style”, onde o autor contava a mesma história de 99 formas diferentes, Matt Madden decidiu fazer o mesmo mas para o formato BD. Assim temos uma premissa relativamente simples: um homem sai do quarto, entra na sala onde escuta a mulher que, do primeiro andar lhe pergunta as horas, e depois de responder o protagonista vai ao frigorífico e percebe que não se lembra do que procurava quando ali foi.
Esta simples sequência é então narrada em linguagem de banda desenhada de 99 formas diferentes. Seja no contexto da organização da das pranchetas, da forma e por quem a história é contada, dos planos de ação, do estilo de desenho, etc.
Aqui Matt Madden homenageia grandes nomes da BD e não só.
Este livro é por isso muito interessante, percebendo-se que basta por vezes mudar uma pequena coisa para o tom ser completamente diferente. para a mensagem da história ser outra.
As minhas favoritas foram a “Emanata”, “One Panel”, “Exercises in love”, “A newly discovered fragment of the Bayeux Tapestry”, “Exorcize in style”, “Public Service Announcement”, “In case of Exercises in style”, “Brought o you by…”, “The critic”, “Actor’s studio II”, “Too Much text”. “No Line”, e”Maximalist” (este lembrou-me a arte do Rui Alex).
Para quem gosta de fazer BD, ou até para quem gosta de escrever, acho que este livro pode ser muito interessante.